Como construir uma empresa desafiadora
“Ser uma marca desafiadora é mais um estado de espírito do
que um estado de mercado”, afirma especialista em competitividade.
Em visita ao Brasil, o planejador publicitário e escritor
Adam Morgan fala sobre como incentivar o espírito competitivo da empresa e como
um pequeno negócio pode continuar desafiador, mesmo depois de se tornar o
número 1.
Adam Morgan é planejador publicitário, consultor da empresa
americana Eat Big Fish e autor do livro “Eating the Big Fish” (ou“Comendo o
Peixe Grande” – o livro não tem tradução para o português). A obra, que já teve
mais de 60 mil cópias vendidas desde seu lançamento, em 1999, mostra como uma
empresa pode competir com marcas líderes do seu mercado. O livro foi baseado em
uma pesquisa realizada por Morgan sobre as maneiras como empresas superam
desafios e obtêm sucesso.
Morgan veio ao Brasil para uma palestra promovida pela
agência Future Group. O evento fez parte da segunda edição do Future Speakers
Series, que reuniu nomes importantes do marketing
mundial. Em entrevista, o
especialista falou sobre como incentivar o espírito competitivo da empresa e
como uma pequena empresa pode continuar desafiadora, mesmo depois de se tornar
a número 1.
Qual é o primeiro passo para se tornar uma marca desafiadora?
Seja claro sobre quem você está desafiando. A maioria das
pessoas presume que uma marca desafiadora está apenas competindo com o líder do
mercado. E claro que isso é um objetivo perfeitamente válido, mas na realidade
essas marcas muitas vezes são bem-sucedidas desafiando outros tipos de coisas.
Um exemplo do que pode ser desafiado é a relação do consumidor com a categoria,
como no caso do lançamento do console Wii, da Nintendo [a empresa lançou um
controle que aumentou a interação física com o jogo]; ou o tédio e marasmo da
própria categoria, como a Vitaminwater [produto à base de água, enriquecido com
vitaminas e sabores]. Então o primeiro passo é ser claro sobre o que você está
desafiando e o porquê disso.
O senhor utiliza o termo “identidade farol”, que deve ser
desenvolvida pela empresa. O que quer dizer com isso? E como começar essa identidade?
Pense em um farol. Primeiro, ele está construído em uma rocha
resistente. Segundo, ele convida embarcações para navegar próximas a ele – e
não as segue, tentando imaginar para onde elas querem ir. Terceiro, ele projeta
claramente em que posição está e o tempo todo, em todas as direções. E quarto,
como resultado, você o nota mesmo que não esteja procurando. Uma “identidade
farol”, portanto, é construída sobre uma verdade que diz respeito ao produto ou
ao serviço, ou sobre a própria empresa, que está no centro do que a torna
diferente. Com essa verdade, o negócio encontra um sentido sobre o que
significa sua marca e seu ponto de vista sobre o mundo. Ao entender muito bem
seus consumidores – todas as marcas devem fazer isso –, a empresa não confunde
entendê-los com “navegar” por eles. Em vez disso, toma uma posição bem clara no
mundo, genuinamente acredita em algo e convida consumidores que acham isso
interessante para que se aproximem disso e se engajem nisso. Depois projeta
essa noção em tudo que a marca faz. Cada elemento de comunicação e cada decisão
de negócios. Sua ambição deve ser conhecida, ser notada mesmo que o consumidor
não esteja a procurando. Nós, como marca desafiadora, não temos dinheiro para
comprar a atenção deles. Então o que irá atrair os olhares do consumidor será o
brilho da ideia que defendemos e a intensidade com que fazemos isso.
Usar mídias sociais é um importante passo para se tornar uma
marca desafiadora?
Com certeza é uma grande oportunidade. E há um número de
marcas desafiadoras que as estão usando de forma bem-sucedida. Mas seria um
erro presumir que todas elas deveriam confiar primariamente nessas ferramentas
como estratégia. Se você tem, por exemplo, um novo produto para bebês, isso
provavelmente seria um erro. Mas, no caso de uma nova linha aérea ou sabão em
pó, talvez não. Em cada caso pode haver maneiras melhores de priorizar seus
recursos.
O senhor afirma que a marca deve ser centrada em uma ideia,
em vez de ser centrada no consumidor. Como fazer isso?
Primeiro, tenha certeza de que você entende seu consumidor
muito bem. Passe muito tempo com eles. Você não é o mercado-alvo; eles são.
Tenha um entendimento tão completo deles que, quando uma ideia surgir na sua
empresa, você terá um instinto bem apurado sobre como eles vão reagir a ela.
Então defina isso como a moeda de troca para todos os seus parceiros de
negócios. Não são anúncios e promoções, e sim ideias que impulsionam sua marca.
Deixe o dinheiro fluir para todas as ideias. Não orce pelo canal, mas decida quantas
ideias você precisa ou quer realizar esse ano, e deixe o dinheiro fluir para
aquelas que realmente farão a diferença, independente de onde elas vêm. Esteja
preparado para experimentar. Tente coisas em escala menor, se necessário.
Aceite que nem tudo irá funcionar, mas observe com cuidado aquelas que poderão
ser ampliadas.
Como continuar competitivo depois que o “peixe pequeno” se
torna grande?
Minha piada corriqueira é aconselhar clientes a evitar o
sucesso a todo custo, porque isso os impede de se comportarem da maneira que os
havia levado ao sucesso. Sociólogos demonstraram que, apesar de nos definirmos
como avessos a riscos, na realidade não o somos. Somos avessos a perdas, e isso
é uma coisa diferente. Se eu lhe dou três fichas de cassino em uma mesa de
roleta, você pode jogar arriscadamente e esse passo pode o levar a 400 fichas.
Mas aí você para de jogar, porque agora está preocupado em perdê-las. Então
você para de se comportar do jeito que o fez ser bem sucedido. Você tem duas
escolhas. A primeira é redefinir o conceito de sucesso, mudar sua definição da
categoria em que você está, de modo que você não seja mais o número um. Agora
você é uma marca desafiadora novamente. A segunda é reconhecer que ser uma
marca desafiadora é mais um estado de espírito do que um estado de mercado. Os
líderes que continuam líderes o fazem porque continuam pensando como as marcas
desafiadoras que um dia foram. Eles permanecem sendo os agentes de mudança,
continuam desafiando o ponto de vista do consumidor sobre as possibilidades da
sua categoria e continuam desenvolvendo esse diálogo.
Como estimular uma cultura competitiva na empresa?